sexta-feira, 15 de julho de 2016

A Fazenda Autossustentável

O século XXI transformou a rotina da humanidade em todos os sentidos. Inclusive dentro da fazenda, onde as tecnologias contribuem para o trabalho no campo, permitindo recordes de produtividade ano após ano. Em contrapartida a responsabilidade ambiental passou a ter um papel cada vez mais importante no agronegócio.


Granja { Dejetos  > Agricultura Irrigada > Indústria }
Foto: Karine da Fonseca
Paralelamente às tecnologias atuais, nasce o conceito de agronegócio sustentável que resulta na união entre produção de alimentos, respeito ao meio ambiente, e lucro. Mas, como desenvolver na prática técnicas que muitas vezes ainda estão no campo das ideias? E como aplicar essas técnicas à exigência de produção cada vez mais alta de alimentos?
Desde a década de 1970, a Alemanha desenvolve técnicas de transformação de dejetos de suínos em energia para alimentar a demanda de fazendas. A técnica é basicamente a queima de gás metano através de biodigestores, produzindo assim o biogás que gera energia. A utilização do gás metano é altamente sustentável, pois sem ela, o gás chega à atmosfera gerando transtornos climáticos em função do aquecimento global.
No Brasil, a Lei 12.305 de 2010, determina no artigo 9º, que somente poderão ser destinados à destinação final os resíduos que não têm nenhum tipo de aproveitamento. Os números mostram que 50% dos resíduos gerados no país, não podem ser enviados aos aterros sanitários, precisando, portanto passar por tratamentos através de centrais tecnológicas. No caso dos resíduos orgânicos, quatro tratamentos podem ser feitos: a incineração, a compostagem, a diluição e a biodigestão. Cada um desses processos casa com a demanda da propriedade.
Procuramos exemplos no Brasil para desenvolver material onde pudesse apresentar aqui, modelos que fossem verdadeiramente adaptáveis às condições do agricultor brasileiro. E mais precisamente no estado do Mato Grosso, na região entre os municípios de Sorriso, Lucas do Rio Verde e Tapurah, conhecemos casos de sucesso que têm, através das experiências do dia-a-dia, desenvolvido formas de conseguir equilíbrio entre o desenvolvimento sustentável e a lucratividade.
A surpresa vem do que era então descartado. Dentro dessas propriedades, os dejetos de suínos e frangos agora geram renda e têm duas finalidades importantíssimas: a geração de energia – através de biodisgestores que produzem o biogás, e a adubação das lavouras – onde biofertilizantes são jogados por meio da fertirrigação por pivôs centrais. Ou seja, o que antes era um problema, gerando transtornos para o meio ambiente, agora gera lucro e sustentabilidade.


A diversificação dentro da fazenda

Empreendedor, Carlos Capeletti percebeu a necessidade da geração de energia logo que veio do Paraná para o Mato Grosso na década de 1980. Até 2003, a energia gerada em Tapurah onde está sua propriedade, era feita através de motor. Em busca de uma solução, viu que tinha que ter um volume suficiente de suínos para alimentar o seu projeto de diversificação. “Eu sempre tive essa ideia. Quando ainda estava no Paraná, assisti uma matéria no Globo Rural onde um fazendeiro tinha 70 produtos criados dentro da sua fazenda que ele mesmo vendia. Ele não tinha atravessadores. Era autossustentável”, lembra.
Com a chegada da indústria de alimentos embutidos e defumados em 1997 na região, Capeletti viu que a ideia que teve no passado podia dar certo. Entendeu que para isso tinha que sair do macro para ser micro, agregando tudo em uma área menor e se direcionando para o sustentável. Já começou então a produzir energia: “o maior problema do Mato Grosso”.
Dedicou-se seus dias para o desenvolvimento de sua ideia. Foi até a Alemanha e conheceu a tecnologia de energia por biogás. Começou a implantar o sistema. Após várias tentativas frustradas até entender melhor, quatro anos depois viu que era através dos modelos das caldeiras das hidroelétricas e termoelétricas das usinas de álcool, onde a queima do bagaço de cana vira vapor e vapor em energia, pensou: “se eles queimam bagaço, eu posso queimar gás metano!”. Mais tentativas foram feitas até acertar: a fazenda virou granja, com agroindústria que fornece insumos para a propriedade.
Para atender o grande projeto de Capeletti, a criação de suínos tinha que ser grande. Consequentemente, precisava de um grande volume de frangos para consumir essa energia, já que os dejetos adubam as lavouras. O resultado? 2000 KVAs/dia para suprir a demanda da parceria com a BRF que oferece os leitões e os pintinhos, além da ração. Após atingirem o tamanho/tempo necessário para abate, os animais são entregues à empresa que carregam os caminhões, rodando as granjas seis vezes ao ano. Hoje, 67.500 porcos estão alojados em núcleos divididos em duas propriedades. Além de 96 aviários com 27 mil frangos/cada.
A primeira etapa desse grande projeto foi a construção da indústria de maravalha a base de eucalipto, que fornece cama para os pintinhos. Com o gás metano produzido nas granjas suínas, Capeletti construiu a primeira caldeira. Prestes a inaugurar a usina, vai produzir já em janeiro de 2016 uma termo de 2500 KVAs, suficientes para sua demanda. Toda essa energia hoje é distribuída nos horários de picos das granjas (entre às 12h às 15h – quando há necessidade de ventilação por conta do alto calor) e dos pivôs (após as 21h). A falta de energia em apenas meia hora compromete automaticamente 50% dos animais. Em duas horas, um prejuízo pode chegar a R$ 15 milhões. “Não dá para brincar”.
A fazenda, enfim, está se tornando autossustentável, onde um setor alimenta o outro: “O dejeto de suíno sustenta a energia elétrica da granja de frango, o adubo do pasto e as lavouras. O dejeto de frango aduba a lavoura através da fértirrigação. A lavoura vai para a fábrica de ração, que alimenta o gado, o frango e o suíno. O quadro autossustentável está se desenhando para um produto de alta-qualidade no final da cadeia”.
A partir da geração de energia, várias ações estão sendo implantadas de forma gradual. Todos os resíduos da fazenda serão destinados à fabricação de ração animal. A lavoura, que hoje já é toda de soja semente, terá destino comercial através da sementeira em estágio final de construção. Os resíduos do beneficiamento das sementes se transformam em ração para boi.
O descarte dos animais por morte natural, entre 3 a 5%, vai para a graxaria, onde as carcaças são congeladas em câmara fria e trituradas. O resíduo desse processo é posteriormente frito numa espécie de caldeira, como se fosse uma enorme panela de pressão. Nesse momento que é separado o óleo da farinha de carne que, por conta da grande qualidade proteica, é vendida para a fabricação de ração para peixes. O óleo é destinado à fábrica de biodiesel, num processo altamente limpo, retirando o metano da atmosfera sem fumaça, fuligem ou cinzas. Caso a taxa de mortalidade atinja índices maiores de 5%, há necessidade de comunicar o INDEA – Instituto de Defesa Agropecuária de Mato Grosso.
Com a autossuficiência da granja de suínos, a ideia é plantar capim somente com adubo orgânico em 270 hectares, fertirrigados desta vez através de sistema de malhas, em locais onde não tem como passar o pivô. O capim fará o trato dos bois que estarão no cocho, buscando a meta de 25 cabeças/ha, já que não haverá pisoteio no campo e sim corte, oferecendo carne nobre. “E assim por diante. A gente vai fazendo todo o processo para chegar no dia que teremos nosso próprio frigorífico, e conquistar a ideia do passado de agregar valor. Aqui o que é considerado lixo para muitos, é para nós matéria-prima de outra cadeia”.
E não para por ai: Capeletti, com a fertirrigação viu que tem como concorrer nas gôndolas e oferecer outros produtos de alta qualidade, como o feijão e o arroz. Nove pivôs fertirrigam hoje 2.300 hectares de 30 mil ha. Um número muito maior dos 750 ha que ganhou do pai quando veio para o MT. A ideia de irrigar surgiu exatamente para solucionar o problema com os dejetos. O problema garantiu três safras/ano. Após testes, o arroz será plantado nas chuvas e fertirrigado, beneficiando muito bem à época das águas.
Além de auxiliar no controle da fertirrigação, todos os bombeamentos, tanto dos dejetos quanto do resfriamento e circulação de água das caldeiras, foram dimensionados e comercializados pela Valmont: “A Valley está no processo do resfriamento da água, do bombeamento da lagoa e em todo o projeto de resfriamento da caldeira. Foi muito importante para a fértirrigação e agora está conosco em mais essa batalha”.
Vinícius Melo, agrônomo e supervisor regional de vendas da Valmont explica: “O dejeto é ambientalmente um problema. O suinocultor tem que aplica-lo de alguma forma. Se é uma propriedade pequena, ele vai usar chorumeira, caminhão, trator ou algo assim para descartar. O que vemos os suinocultores dessa região fazerem é conseguir eliminar tudo, transformando o problema em solução”.
Hoje toda a lavoura de soja, milho, feijão e arroz são comercializados. Em breve, os grãos, semente de soja e carnes bovina e peixe terão sua marca própria à venda. Exceção apenas para porcos e frangos que são mantidos pela boa parceria com a BRF. “Frango e porco são autossustentáveis. Eles são a matéria básica de toda a cadeia. O porco é a energia e o frango a adubação. Não tem como deixar de ter. O dejeto é hoje, em toda criação, um problema ambiental, que aqui é resolvido: deixou de ser problema para ser lucro”.


Gosto pela suinocultura desde os tempos de escola

Atrás de terras maiores e baratas, Fausto Scholl veio também do Paraná para o Mato Grosso com o pai. Assim como a grande maioria de sulistas agricultores fora da região, ele e sua família deixam o Sul do país em busca de novas oportunidades. A lavoura e a pecuária sempre foram o ganha pão da família Scholl, que continua até os dias de hoje cultivando. Também como Carlos Capeletti, Fausto se torna irrigante para construir a sua granja de suínos em 2004.
A geração de energia através de dejetos suínos sempre fascinou Fausto Scholl. Desde a época da escola agrícola ainda no Paraná, Scholl estudava a técnica, que foi apresentada como trabalho de conclusão de curso: “Eu disse quando sai em 1990 do colégio agrícola que ia ter uma granja de porcos. Queria mexer com criação de suínos sustentável”. Assim, antes mesmo de construir a granja, sabia que precisava adquirir pivôs centrais para ter onde descartar os dejetos. A técnica é basicamente a mesma nessas propriedades, onde o dejeto tem duas saídas: energia através do biodigestor e irrigação das lavouras. E completa: “o biodigestor faz energia que alimenta a granja de porco. Um porco produz energia para si mesmo”.
Dos seis pivôs instalados, metade é utilizado para fertirrigar e a outra metade só não o faz pela distância da lagoa de dejetos. Logo que chegamos na propriedade São Miguel, vimos duas lavouras de soja: uma fertirrigada e outra não. A diferença é impressionante! Como Capeletti, Scholl também acredita que a melhor lavoura para fertirrigar durante o período chuvoso é a lavoura de arroz: “É muito nitrogênio! O dejeto passa pelo biodigestor... e não é como faziam os antigos, aquele chorume gordo. O nosso aqui é mais uma água suja que colocamos na lavoura. Tem que cuidar porque a planta que recebe, cresce demais. Vegeta”, conta. A ideia é adquirir mais seis equipamentos.
Além da granja de suínos que abastece o frigorífico da empresa através da parceria, Scholl confina gado e faz três safras/ano, através da fertirrigação. Seu ano agrícola começa em setembro quando planta a soja e colhe em dezembro/janeiro. Logo entra milho ou arroz e em seguida feijão. Os grãos são comercializados, salvo a semente que vai para a UBS – Unidade de Beneficiamento de Semente, instalada na própria fazenda, e com capacidade para oito mil toneladas.
A propriedade ainda tem construída fábrica de ração com base em matérias-primas como: milho, soja, milheto, sorgo e resíduos da UBS, todos cultivados para atender o gado confinado do grupo. Há também projeto de irrigação de sistemas de malhas, em espaços entre os galpões e pivôs, para suprir a necessidade de descarte de dejetos nos meses de chuva. Nessas áreas serão plantadas gramíneas.
Antenado às tecnologias Valley e buscando alternativas de precisão, Scholl tem instalado em sua propriedade o sistema Base Station – equipamento de telemetria desenvolvido para controlar a irrigação à distância: “O Base Station é acomodação! Funciona muito bem. Todo celular funciona bem. O problema aqui no Mato Grosso se chama luz” – se referindo à baixa qualidade da energia elétrica fornecida.
Seguindo a trajetória de eficiência e produtividade, está prestes a ser instalado o Valley Corner – equipamento com grande potencial de irrigação, utilizado para maximizar o uso do solo na propriedade, irrigando áreas até então inatingíveis. “Com o Corner vou aproveitar o espaço entre a granja de porcos. Ele vai desviar um pedaço da estrada e irrigar 16 hectares que antes não eram irrigados”.
O projeto do Corner na propriedade de Fausto Scholl foi financiado por um fundo de incentivo à busca da eficiência energética, em uma ação em conjunto com  companhia elétrica do estado a ENERGISA, visando a melhoria dos sistemas de  irrigação. “Com o argumento de produzir mais em menos espaço e com a mesma quantidade de energia, o projeto foi financiado pela própria concessionária elétrica. Como esta é uma fazenda autossustentável, ampliamos a capacidade produtiva, utilizando os mesmos recursos. Além da aquisição do Corner, a companhia financiou também a reforma de um pivô, promovendo a atualização tecnológica do equipamento e melhorando a parte hidráulica do projeto. Tivemos melhoria na eficiência de aplicação da água e, com a instalação de uma chave inversora de frequência, um melhor uso da energia elétrica”, explica Vinícius Melo.
Ao todo, na Fazenda São Miguel, divisa de Sorriso com Lucas do Rio Verde, 808 dos 4100 hectares são irrigados. No intuito de implantar uma nova atividade na fazenda, o empresário está licenciando ambientalmente um projeto de piscicultura, onde dois reservatórios serão construídos, promovendo o aumento da disponibilidade de água, possibilitando assim a instalação de novos pivôs no futuro, integrando lavoura e produção de peixes. “Uma das licenças já saiu. Tem que limpar e encher. Estamos esperando a compensação da SEMA – Secretaria de Estado de Meio Ambiente”, diz Fausto Scholl.


A propriedade que se tornou indústria

A geração de energia, feita através do gás liberado pelo dejeto de animais, alimenta a demanda das instalações. Nessas propriedades a rotina segue dessa forma: as lavouras de soja, arroz, milho e feijão são fertirrigadas com os dejetos das granjas. Dessas lavouras saem os alimentos para os animais, que estão nas granjas abastecidas pela bioenergia gerada na própria fazenda. Assim o ciclo toma forma e nada é descartado: animais, biogás, energia, dejetos e lavoura.
Mas é na propriedade de Paulo César Lucion onde o ciclo da fazenda autossustentável melhor se fecha. Atuando na atividade de suinocultura já mais de três décadas, o grupo Lucion é destaque no mercado. Além das lavouras que abastecem as granjas, de onde saem os dejetos que fertirrigam e geram energia, o animal é abatido no próprio frigorífico, de onde saem empacotados cortes e produtos de origem suína direto para as gôndolas.
Vindos de Santa Catarina, a família Lucion chegou ao Mato Grosso em busca de menor custo de produção. Suinocultores já no estado natal, migram para sair de uma crise de alto custo de grãos. Na época, a produção era 10% do que o grupo conquistou hoje.
Toda a produção é própria, desde a lavoura de grãos onde o milho e a soja são transformados em ração, passando pelo óleo que é direcionado para a fábrica de biocombustível, até o dejeto que é transformado em gás – gerando energia para as granjas, e adubo – fertirrigando as lavouras. Os animais são tratados pela ração fabricado na propriedade e abatidos pelo frigorífico do grupo. Ou seja, de fato uma fazenda autossustentável.
Há apenas quatro anos como irrigante, a ideia de fertirrigar surge depois da apresentação feita pela revenda Valley. “A solução do que era para nós um problema, foi o Alei que nos apresentou”, referindo-se ao representante Valley da revenda Irrigar em Sorriso, Alei Fernandes. Nós não acreditávamos que iríamos conseguir através do pivô. Mas com as inovações e as ideias inovadoras que o pessoal do Alei trouxe para nós, a gente conseguiu conciliar a irrigação com a fertirrigação. Foi tão positivo que conseguimos baixar nosso custo de produção. Todas as lavouras fertirrigadas têm zero adubação química. A produção é apenas com adubo orgânico”, explica Paulo César Lucion.
“Vimos a necessidade de o Paulo distribuir o grande volume de dejeto, aproveitando a uniformidade da distribuição. Apresentamos a ele o exemplo de propriedades menores que já utilizavam o pivô para fertirrigar. Ele teve bastante dúvidas. Fizemos o teste que deu certo. Evoluímos. E a tendência é expandir futuramente”, lembra Alei Fernandes, da revenda Valley Irrigar.
A solução que primeiramente surge como forma de descarte do dejeto suíno, hoje ganha espaço também como irrigação. Pela indisponibilidade de energia, não há como instalar mais pivôs na propriedade de Sorriso. “Hoje fazemos três safras/ano. Se tivéssemos energia disponível, mais pivôs centrais estariam instalados na fazenda. A irrigação nasceu da necessidade, mas hoje, sabemos que mesmo que não sendo para dejeto, é uma técnica muito viável. Temos projetos não fertirrigados em outras propriedades, em função de se poder fazer uma safra a mais por ano”. Além de soja e milho, o feijão entra como a terceira safra, sendo mais um produto do grupo no mercado.
A fertirrigação, no caso do Grupo Lucion, proporcionou uma queda de 35% nas despesas totais, já que as lavouras utilizam 100% de adubo orgânico. Além de oferecer produto menos ofensivo nas gôndolas, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento selecionou em 2014 dez empresas para divulgar a sustentabilidade no Brasil. Dessas, a única empresa privada selecionada foi o Frigorífico Nutribrás – pertencente do grupo. “O que é subproduto de uma atividade, já é matéria-prima para a atividade seguinte. Fecha o ciclo”.
Em suas viagens pelo exterior conhecendo técnicas e fechando parcerias, Lucion garante que as grandes empresas do seguimento fastfood já dizem que muito em breve o produto que tiver o diferencial de menor agressão, será uma exigência do mercado, que tende a comprar de empresas que não agridam o meio ambiente.
“A verdade é que a suinocultura é uma atividade altamente poluente. Com a fertirrigação, conseguimos produzir sem poluir. Além de utilizar 100% de adubação orgânica, percebemos que há menor necessidade no uso de defensivos. A lagarta, que ataca a planta, com o uso do dejeto, ataca menos. Outra curiosidade é com a safra do milho. Percebemos também que o milho fertirrigado consegue render até 30% mais que a safra normal”. E finaliza: “a sustentabilidade só existe se houver equilíbrio entre o ambiental, o social e lucratividade. Esse é o tripé da sustentabilidade. Não tem como falar que uma fazenda é autossustentável se não houver lucro. A fertirrigação foi passo importante para conseguirmos esse tripé”.

Criada há dois anos, a Aprofir – Associação dos Produtores de Feijão Irrigado, surge para acelerar a produção do grão na região, buscando a meta de ser a maior produtora do país. Tendo como presidente, Ademir Gardim, a associação está em processo de fomentar o Seminário de Feijão Irrigado e o Congresso Brasileiro de Feijão-Caupí que deve acontecer na cidade de Sorriso. Além dos irrigantes de feijão, a associação atende também os irrigantes de trigo.
Entre as ações já acertadas está o canteiro retido no parque tecnológico, uma estruturação do executivo com entidades. Com 100 hectares disponíveis para o desenvolvimento de várias atividades, a Aprofir faz parte do conselho administrativo do parque.
A maior questão levantada pela associação é a descentralização por parte das licenças para a agricultura irrigada. A maior razão de se escolher Sorriso como sede da Aprofir é ter no município apoio do executivo municipal, da Secretaria de Agricultura e Meio Ambiente do município, além dos produtores do grão.
Através das lideranças da associação, o Plano Estadual de Irrigação do Mato Grosso foi apresentado ao governo do estado. Os produtores foram até a capital, Cuiabá e em reunião com governador Pedro Taques, foi determinado prazo para a criação do plano que tem como meta dobrar em dois anos sua área irrigada, ou seja, mais 70 mil hectares.
Várias entidades foram solicitadas, entre elas organizações ambientais e de energia, além de entidades financeiras para a execução de um projeto piloto. Outras cidades mato-grossenses já estão levando o exemplo, como as cidades de Primavera do Leste e Campo Novo dos Parecis.
“Nessas regiões se concentram boa parte da agricultura irrigada do estado. Por isso essa provocação ao governador. Ele acatou e quer desenvolver. Para desenvolver o estado tem que produzir mais e melhor. O potencial do Mato Grosso é muito grande, portanto é hora de se organizar e efetivar o plano que com certeza vai melhorar e muito a irrigação estadual, além de auxiliar o produtor a ter lucro, produzindo de forma sustentável”, conclui Gardim.

Em uma região tão focada na produção irrigada, até o Prefeito Municipal de Sorriso faz parte dessa empreitada. Agricultor, Dilceu Rossato tem grandes expectativas para a cidade. Produtor de soja, milho e feijão, consegue três safras/ano através da irrigação. Irrigante há dois anos, viu que sua área irrigada melhorou e muito o potencial da lavoura. “Com a irrigação você tem um plantio determinado na época que você pode fazer. E pode fazer três safras/ano e três safras cheias. O clima do plantio começou em 15 de setembro e a minha soja já está florescida. Essa é a grande diferença”, conta.
Dentro dos projetos à frente do executivo municipal é tornar a região como a maior produtora de feijão do país: “temos grandes expectativas por conta da construção da Aprofir – que veio em boa hora, e com o Governo do Mato Grosso – através dos órgãos ambientais e a política de irrigação que o estado defende. Tudo isso está se concretizando”, referindo-se ao Plano Estadual de Irrigação apresentado ao Governador do Estado, Pedro Taques.
Animado, continua: “Estamos trabalhando junto com a Secretaria de Meio Ambiente nesse sentido. A ideia é acelerar para que a secretaria descentralize todos os serviços, dando assim mais agilidade ao município”. Junto com a SEMA, a prefeitura municipal quer conduzir os projetos de irrigação, permitindo 20% da área do território municipal irrigado. Em torno de 130 mil ha irrigados.
O projeto de aumento da área irrigada une à construção de represas outra atividade: a piscicultura. “O sentido do projeto é ocupar as represas com piscicultura que no final a água seja utilizada para a irrigação, completando assim um processo inteligente, rápido e com viabilidade financeira”.
Vindo de uma família de pequenos agricultores, Dilceu Rossato vê a irrigação com ferramenta importante para as lavouras mato-grossenses. “Onde foi irrigado deu certinho para fazer a terceira fase. Isso economicamente dobra o faturamento de uma fazenda. Não é o que naturalmente acontece no Mato Grosso que ás vezes para de chover em maio, mas ás vezes em março”.
Rossato quer garantir irrigação não só para a agricultura extensiva mas também para a familiar. Em fase final, o prefeito irrigante está entregando o projeto de irrigação em 214 propriedades assentadas na cidade.

Hilário Schulz – o plantador de melancias

Foto: Karine da Fonseca
Somos recebidos na Fazenda Pérola por um senhor quieto, mas de sorriso fácil. Hilário Schulz é daquelas pessoas que a gente passa horas conversando sem prestar atenção no relógio. Sua história, como tantas, rende não apenas poucas páginas em uma revista, mas um livro inteiro.

A entrevista começa com risadas, quando conta que seu primeiro presente quando criança foi uma enxada. De família de agricultores do Rio Grande do Sul, aos três meses de idade foi com a família para o Paraná. O pai estava atrás de oportunidades de crescimento. Na lida desde cedo e sempre do lado do pai, foi aprendendo o ofício, ajudando a plantar milho na matraca. Enquanto o pai fazia os buracos, ele com uma latinha de sementes, tirava de duas em duas e plantava os pés de milho. “Ao invés de criar raiva, criei foi amor pela agricultura”.

Além do milho, na fazenda dos Schulz também se plantava feijão e soja, além de suinocultura para consumo próprio. Uma típica agricultura familiar com 75 hectares de lavoura. A família de cinco filhos trabalhava unida em busca de uma vida melhor. Neto de alemão, o avô de Hilário veio para o Brasil em 1919, onde se instalou em Santa Rosa no RS. “Sofreram muito”.

Hilário percebeu logo que não era no Paraná que estava seu futuro. Como o pai tinha o sonho de crescer. Viu que tinha possibilidade de conseguir esse sonho aos 16 anos, quando sempre do lado do pai, saiu para conhecer novas terras. Rondônia, Acre, Amazonas, Pará, Mato Grosso e até na Bolívia chegaram, em busca de oportunidades. No jovem Hilário surge a ideia que mudaria de fato sua vida: “Nasceu em mim um desejo de fazer parte de uma nova fronteira agrícola, onde a gente pudesse ter condições de produzir em maior área maior”.

Jovem, com pouco estudo, mas sábio, buscou conhecimento através da Embrapa e viu que podia realizar aquele desejo produzindo no cerrado, em solo fértil, porém adotando tecnologias. E foi através de uma pesquisa da Embrapa, em Luiz Eduardo Magalhães, na Bahia, que viu que tinha condições de produzir em outro lugar como tinha sonhado. Mas, para isso precisava de se estabelecer para adquirir terras tão distantes de casa.

Aos 18 anos já plantava sua lavoura de trigo em um pedaço de terra que tinha ganhado do pai. “Fui tão abençoado que consegui colher muito bem já na minha primeira lavoura. O clima cooperou. Esse foi meu começo”, conta orgulhoso. Foi plantando e colhendo trigo que fez seu pesinho de meia. Casou-se e logo decide vender os 12 ha que tinha e junto com o que tinha juntado, segue com a esposa para o oeste baiano, em 1980.

Na época, nem a cidade de Luiz Eduardo Magalhães existia. Ali era um pequeno povoado chamado Mimoso do Oeste. Mas foi no município de São Desidério que Hilário adquiriu o primeiro pedaço de chão baiano, e onde montou com a mulher uma barraca para começarem a vida. Nessas condições ficaram por oito meses, debaixo de lona. Apesar de muito jovem, com apenas 22 anos, era sozinho que buscava orientação enquanto preparava solo para plantio. Aos poucos foram aprendendo e descobrindo o que a região tinha de melhor e pior. “Foi difícil. E aqui na nossa região era mais complicado, porque as terras eram mais pobres, as chuvas não cooperavam e o solo arenoso. Mas, a insistência junto com pesquisa e adotando as tecnologias da Embrapa, fomos melhorando”, lembra.

Sua primeira lavoura baiana foi de arroz. “Primeiro ano perdi arroz. Foi amarga a experiência”, conta. Plantou soja e equilibrou as contas. Devagar e com insistência foi aprendendo como trabalhar na nova terra. À sua volta, além de um novo lugar, a dúvida se ia dar certo: “Muitas vezes à noite eu ia para o campo e botava a terra na mão, molhava, lavava, mexia... e via só areia. Pensava “o que a gente vai produzir aqui?” Mas ai pensava: “Não! Nós vamos insistir aqui e vai dar certo!”. Era esse otimismo era o que ia transformando a vida de Hilário.

Observando os estudos da Embrapa, viu que apesar de não colher a soja que costumava a ver no Sul, podia plantar o grão ali. Confiou que logo descobririam uma variedade que se adaptasse melhor. Visitando a unidade da empresa em Brasília, soube que tinha jeito de produzir trigo irrigado e que era melhor que o que ele plantava no Paraná. Nascia mais um sonho! “Eu vi que com o pivô tinha condições de produzir bem por conta do fotoperíodo aqui ser muito bom”.


A transformação através da irrigação

Em uma parceria instalou 16 pivôs, mas não deu certo. Passou pelo comércio e voltou a tocar a sua roça. “Eu tinha esse campo que estava com pecuária. Voltei e devagarinho fui montando os meus próprios pivôs. Eram dois, depois mais dois... hoje são 2000 hectares irrigados!”.  

A decisão pela Valley veio por conhecer o equipamento em funcionamento na região de Cristalina, GO. “Decidi para poder ficar mais tranquilo, acomodado e despreocupado. Não estraga à toa. Me dá mais comodidade e segurança. É não ter problema! É um caro que sai barato”.

Atualmente produzindo duas safras/ano, só deixou de fazer a terceira pelo alto valor da energia. “A água é a maior riqueza que nós temos! E com a irrigação conseguimos colocar comida na mesa das pessoas três vezes ao dia. As pessoas mesmo assim acham que somos vilões, e isso não é verdade. Estão completamente enganados. Eles têm que ver e analisar direito o tanto que é difícil produzir, muitas vezes a preços tão baixos e sem auxílio do governo. Procuramos sempre fazer o melhor, com reservas, melhoramento e aproveitamento de solo... tudo para garantir produção para a população”, desabafa.

Sempre otimista, mesmo com os problemas diários em se produzir muito e para tanta gente, observa com é ser irrigante: “Ninguém sabia quanta riqueza tínhamos aqui quando chegamos. A água que temos aqui é muito boa, junto com a luz. Naqueles dias de janeiro e fevereiro, com aquele solão e um veranico que não passa, você olha para o céu e nada de chover. Poder apertar um botãozinho e molhar a tua terra, ver a cultura bonita... isso é muito gratificante!”


A melancia da Fazenda Pérola

É da Fazenda Pérola que sai melancia para quase todo o Brasil. Em média, durante a época de colheita, 25 caminhões/dia saem carregados, levando a fruta do Sul ao Nordeste. Em torno de 200 pessoas trabalham na lavoura, numa operação manual em função da fragilidade do fruto.

Ao todo Hilário Schulz produz em uma área de 5 mil ha. Precavido faz, de cinco a sete culturas, pois “se uma não der a outra dá”, diz. Entre tantos produtores de grãos e algodão na região, ele se destaca por produzir um produto com proporções bem maiores. A quantidade de produção da fruta é impressionante. Em 2014, dois mil hectares foram utilizados para o plantio. Uma média de 40 toneladas/ha.

Além da fruta, milho, feijão, soja, algodão, abóbora e arroz – que deixa a palhada para proteger a melancia – são cultivados irrigados e em sequeiro. Nos 2 mil hectares irrigados, todos com pivôs Valley, há variedade de tamanhos. São 13 pivôs instalados entre 60 ha (o menor) e 280 ha (o maior com 19 lances). Mas o mais impressionante nem são os números produzidos na fazenda, mas o sabor da melancia! Suculenta e doce na medida certa, além de uma cor vibrante que enche os olhos. A receita está no clima quente, com baixa umidade do ar, luz solar direta e irrigação.


            Amor pelo que faz

Dá pra ver nos olhos de Hilário Schulz a paixão pela agricultura e pelo trabalho na fazenda. Tanto que sua maior preocupação é imaginar quem vai produzir alimento para a população nas próximas décadas. “É muito gratificante saber que estou contribuindo com o povo. Plantando comida para o povo. Tem muito produtor que não consegue ter os filhos no campo. Quem vai produzir alimento para essa gente daqui a 20 anos?”.

Competindo, está o amor pelos filhos, Maikon e Siguinéia e a mulher Zilá. Assim como fazia com o pai, Hilário tem os filhos trabalhando com ele em áreas distintas do escritório da fazenda. “Poder ter os filhos do lado e todo mundo trabalhando juntos e unidos é muita alegria! Todos com o objetivo de crescer e fazer as coisas certas!”, orgulha-se.

Outro grande orgulho é a esposa Zilá, companheira desde os meses acampados no barraco de lona quando chegaram a Bahia. “Ela está comigo sempre! Se eu for pra roça, ela vai. Se eu for pra cidade, ela vai! Geralmente as mulheres não querem ficar na roça, mas ela não! Me acompanha. Até quando eu vou pescar ela vai”, conta rindo. Aliás, pescar é a distração de Hilário. É onde descansa e pensa na grande história de vida que construiu e que ainda escreve com maestria. “Eu estudei muito pouco. Não me formei em nenhum curso. Fiz apenas o básico, mas, o amor que a gente criou pela terra e por produzir, além do sonho de crescer e de ter uma área maior para adotar tecnologia, que me fez ter tanta força para chegar aonde cheguei”.


São homens e mulheres como Hilário e Zilá que abrem as fronteiras para a economia do agronegócio brasileiro. São pessoas como eles que desenvolveram lugares até então sem condições de produção, como é o caso do oeste da Bahia há 30 anos. Hoje, para todos os lados na região, se vê tecnologia de ponta e lavouras que impressionam. A força, a coragem, a insistência e, sobretudo a cooperação de uns com ou outros, de gente que como eles transformaram a paisagem daquele sertão, sendo hoje uma região promissora, rica e de onde sai muitas toneladas de alimentos Brasil afora.


*Matéria publicada em Pivot Point Brasil - dezembro de 2015

5 safras em 2 anos: A garantia de colheita através da irrigação

Foto: Karine da Fonseca

Visitamos duas regiões irrigadas do Brasil, buscando trazer informações específicas sobre a capacidade real da produção agrícola que cresceu, e muito, nas últimas três décadas




Na região de São Desidério na Bahia, encontra-se as maiores produções agrícolas do Brasil. Distante 878 km de Salvador, até a década de 1980, o município sobreviveu da agricultura de subsistência, com pequenas produções e comércio quase inexistente. A partir de 1985 a região toma impulso com a chegada de migrantes do Paraná, Rio Grande do Sul e São Paulo, atraídos pelos baixos preços das terras e a possibilidade de plantio com o manejo do cerrado e a riqueza hídrica da região.

A realidade da cidade hoje é completamente oposta. Em 30 anos a agricultura de São Desidério se destaca atingindo o ranking de maior PIB do estado e chegando em 2012 como o município brasileiro com maior valor de produção agrícola, onde atingiu R$ 2,33 bilhões, disputando o pódio com Sorriso - MT.

A irrigação é a maior garantia dessa megaprodução. Vizinha de São Desidério, fica Luiz Eduardo Magalhães que há 15 anos era apenas uma vila e hoje tem mais de 80 mil habitantes. Toda essa riqueza no oeste da Bahia é gerada basicamente da agricultura irrigada, transformando a condição da região que conta com índices pluviométricos entre 800 a 1200 mm.


Família Busato

Em 1988, Júlio César Busato e o pai, Hélio Busato saem do Rio Grande do Sul a procura de novas terras para agricultura nos estados da Bahia e do Mato Grosso. Paralelamente à expansão da agricultura no cerrado baiano, novas fronteiras são abertas. Logo que conhece a região, o patriarca da Família Busato decide ficar, mesmo sem conhecer a realidade das terras mato-grossenses. Viu ali a chance que procurava.

Com um sol firme durante todo e ano e o fácil manejo hídrico, a questão da irrigação já era muito discutida. Em busca de melhores preços do feijão, viram a oportunidade de produzir fora de época para atingir melhores preços. Logo os outros três filhos do Sr. Hélio vieram para São Desidério, seguindo a tradição de gerações de agricultores.

A princípio começam irrigando 50 hectares com um pivô em sociedade com um vizinho. Em 1992 a família adquire mais dois equipamentos, investindo assim anualmente na aquisição de pivôs. Para o Sr. Hélio a irrigação é algo importante, onde vê essa como uma ferramenta fundamental para dar segurança e produtividade. Mesmo com o Estado da Bahia não tendo tecnologia na época, e passar por complicações ora por conta dos veranicos, ora por conta das interrupções do regime climático, com a irrigação não teria dificuldade em colher. Teria sim um ano tranquilo com boa colheita e safra descasada com pico de produção. “Essa é uma forma de não ter dificuldade com a lavoura e dar sustentabilidade ao negócio! Esse foi o grande lace de irrigar nesses 25 anos”, garante a nova geração de irrigantes da família, o Engenheiro Agrônomo César Busato, filho de Júlio César e neto do Sr. Hélio e quem recebeu a equipe Pivot Point Brasil na Fazenda Busato I.

No começo os Busato irrigaram basicamente feijão, soja e milho. Na propriedade já produziram mais de 12 culturas diferentes, desde hortaliças como cebola e tomate, até amendoim, milho pipoca, milho convencional, testes com alfafa, cana de açúcar e fumo. A produção de 2 a 2,5 safras/ano, depende do conjunto. Já foram feitas até três safras/ano, mas viram 2,5 ser um ótimo número. “Não atemos a uma cultura. Sempre buscamos coisas novas para tentar integrar e agregar o sistema de irrigação”.

Em 2003 a Fazenda Busato foi pioneira na adoção do sistema de manejo de irrigação da Irriger. “Uma das propriedades, a Fazenda Busato II fica próximo ao Vale do São Francisco. Com um solo muito instável, sob um mesmo pivô temos variações de mais de 30 pontos de argila, em um ponto 3% e em outro 33%.

Para conseguir irrigar um solo tão complexo, exigiu-se conhecimento e tecnologia. “Através do Professor Everardo – grande referência em irrigação no Brasil - apostamos que o programa auxiliaria muito no trabalho, além de poder saber o que foi gasto e com sustentabilidade. Ao longo do tempo conseguimos ganhar confiança. A Irriger além de dar um parâmetro, nos dá segurança de que estamos fazendo um bom trabalho, diminuindo ainda a incidência de doenças e aumentando o volume do produto final”.

A produção atual da Família Busato é trabalhando com soja precoce, seguindo de algodão para escapar do período mais frio e finalizando com milheto para manejo e conservação de solo. O grupo familiar, como preferem chamar, colhe média de 65 sacas de soja, 180 de milho e 300 arrobas de algodão por hectare. Cada membro do grupo cuida de uma área: financeiro, agrícola, técnica, administrativa, mecanização, logística e infraestrutura. Além disso Júlio César Busato é o atual presidente da Associação Baiana de Irrigantes e Agricultores.

Ao todo, nas nove propriedades, ou nove módulos gerenciais como titulam, 41 mil hectares de área, 46 pivôs e 4.500 ha são irrigados. “A pessoa tem que estar preparada para um time muito mais apertado para um nível de organização um pouco maior e ver a fazenda como um sistema diferente do sistema sequeiro, onde os ciclos acabam. Na irrigação o ciclo nunca acaba. Sempre há safra. Isso gera renda, melhor fluxo em caixa e máquina muito mais eficientes com tecnologia de ponta”, completa César Busato.


Grupo Decisão

Nessa propriedade fomos recebidos pela nova geração da família tradicional de agricultores, Ariel Zancanaro Zanella. O grupo é liderado pelos Zancarano, onde o avô Nelsir e os quatro filhos cuidam de toda a rotina do Grupo Decisão. A chegada da família na Bahia tem início no estado natal Rio Grande do Sul, seguindo para a cidade de Cascavel, PR, onde buscavam novas oportunidades.  Depois de décadas, a família vai para Unaí, MG onde o pai Celestino Zanella e o tio João ficam por 20 anos, até decidirem ir para a Bahia, mais precisamente em São Desidério.

Na cidade mineira começam a irrigar em 1990. “Pivô significa diferencial”. A vantagem de se utilizar o sistema já era conhecida pelos tios, que continuaram irrigando em Unaí, tendo a opção de comprar área para ser irrigada na Bahia.

Com duas unidades distintas, o Grupo tem uma área em sequeiro, mas para aproveitamento de terra. Em Unaí produzem café, feijão, trigo, soja e milho. Já a unidade de São Desidério cultiva soja, feijão, milho e algodão, aproveitando da altitude e temperatura na Bahia, garantindo assim a produção.  “A irrigação nos permite toda essa gama de culturas diferentes numa mesma área”.

Utilizando alguns pivôs para 02 safras/ano e outros com 03 safras/ano onde fazem milho, soja e feijão, sempre levantando a importância do manejo. Com planejamento adequado, trabalham em ciclos onde em um mesmo pivô, a mesma cultura não volta antes de passar por todas as outras. “Cada cultura tem sua peculiaridade e vantagem. Às vezes duas culturas proporcionam mais do que as 03 que fazemos em outro pivô. Depende do ano, da safra e da época”.

E é o planejamento a palavra de ordem do Grupo Decisão. Tudo gira em torno de reuniões com os líderes e responsáveis pelas propriedades. Principalmente com o planejamento de rotação de culturas: “Visualizamos a parte financeira? Sim! Mas o nosso foco é agronômico. Nós não plantamos uma cultura em determinado pivô simplesmente porque naquele ano ela vai ser financeiramente mais lucrativa. Tem toda uma rotação de cultura com a parte agronômica atrás. Ou seja, nós vamos continuar plantando feijão, soja algodão e milho. As áreas mudam 200, 300 hectares por conta da própria rotação de cultura. Sentam as pessoas que decidem pela fazenda e planejam a base”.

Experts no manejo de 03 safras/ano plantam 11 meses/ano e colhem 11 meses/ano – não necessariamente em sequência, havendo necessariamente o tempo de um mês. “A parte operacional é muito mais ativa. Enquanto que no sequeiro existem 06, 07 meses onde há funcionários contratados e depois essa mão-de-obra não é mais necessária, irrigando trabalhamos com esse quadro de funcionários o ano todo. A parte operacional é muito mais rápida e o planejamento tem que ser muito bem feito: se atrasa um pouquinho numa cultura, perde consequentemente na outra. Isso gera mais dinamismo e renda”.

Outra importante opção do Grupo é o plantio de milheto e crotalária como lavouras de cobertura. O Decisão não se limita apenas ao milho para a palhagem de solo e acredita que essa é a solução para as áreas da Bahia. O objetivo da rotação, além de limitar pragas, é a matéria orgânica. Quanto mais matéria orgânica, mais micro-organismos que vão competir com as nematoides. “Esse é mais um plus da irrigação”.

Pioneiros também na implantação do sistema Irriger desde 2006, tiveram dúvidas quando o programa foi implantado. Após o relatório de safra, perceberam que podiam produzir mais com menos 28% de água só no primeiro ano. “A planta tem uma necessidade hídrica para cada momento. A Irriger mostra e prova que é eficiente. Se não tiver acompanhamento, pode ser tomado decisão errada. E o custo do serviço? “se paga fácil, além de menor aplicação de fungicida e melhor fitossanitário: outro plus da irrigação”.

A decisão pelo equipamento Valley veio pela confiança adquirida e pelo suporte adequado. Ao todo o Grupo conta com três propriedades na Bahia e uma em Minas Gerais, totalizando 3.299 hectares irrigados com 29 pivôs. Para o futuro, a intenção é irrigar mais sete mil hectares. “Se a irrigação não fosse vantagem não teríamos conseguido chegar até aqui. Sem a irrigação a gente teria conseguido trabalhar por um ou dois anos. Nos outros anos a perda seria de 60 a 70%, senão total. A região de São Desidério é de 800 a 1200 mm de chuva, ou seja, não teríamos conseguido”.


Imagem: wikipedia.com 

Localizado na região noroeste de Minas Gerias, Paracatu fica a 500km da capital Belo Horizonte. Conhecida por ser a maior produtora de grãos do estado, a mesorregião é a maior produtora de feijão do país. O clima quente proporciona veranicos severos com possibilidade de sucesso na colheita das lavouras com a irrigação.

Há 30 anos, a região se beneficiava apenas de pecuária de extensão e da prática do garimpo de exploração. Com a chegada da irrigação, o aspecto da região mudou, principalmente nos últimos 15 anos. Hoje a cidade tem a economia voltada para a agricultura, coisa que não seria imaginável em temperaturas altas e a grande presença de veranicos.

No maior município irrigado da América Latina, algo em torno de 400 mil hectares conforme a Agência de Desenvolvimento Sustentável do Noroeste de Minas (Adesnor), visitamos três propriedades, cada uma com sua peculiaridade, mas todas com uma característica: de duas a três safras/ano bem definidas.


Família Veloso

Há 20 anos Danilo, Dalmir e Décio Veloso chegaram a Paracatu deixando a cidade natal de Carmo do Paranaíba, também em Minas Gerais, onde eram pecuaristas de leite, em busca de crescimento e inovação. Na época adquiriram área para plantio de milho para silagem em sequeiro.

Não demorou muito para entrar na atividade agrícola como irrigante, seguindo os conselhos de um amigo, e entrar de fato no ramo da agricultura, podendo assim aproveitar e adquirir grandes áreas em oferta na região que sofria crise econômica. Era o momento de entrar no negócio. Começaram com dois pivôs e foram abrindo área. “Já entramos no seguimento com a intenção de produzir com uma meta estipulada que dependeria exclusivamente de irrigação, tecnologia e escolha de semente”, diz Danilo Veloso.

Hoje são nove equipamentos, onde dos 1.550 hectares de área, 530 ha são irrigados. A produção em sequeiro ainda é realidade em uma das três propriedades, por conta da dificuldade em utilizar recursos hídricos. Irrigando conseguem plantar soja em outubro, colher em fevereiro, entrar com o milho em março, colher em junho e logo plantar feijão que é colhido em setembro. “Sempre deu certo”, garante. Outra produção é milho semente, o que na região, é feito com a parceria com sementeiras que aproveitam o clima agregado à irrigação por pivô central.

Com o projeto de irrigar mais 270 hectares em breve, Danilo Veloso diz convicto: “É melhor ser irrigante do que não ser. A frustação com o sequeiro é muito grande. Quando a planta precisa de água, não tem chuva e não se pode fazer nada. Com a irrigação a gente decide a hora certa. É um prazer plantar com irrigação. Produzir alimentos assim é fácil. Hoje é inviável plantar sem irrigação. Tenho área de sequeiro e não quero mais plantar. Se não for irrigado, vou dar murro em ponta de faca”.


Fazenda Santo Aurélio

Galba Vieira Cordeiro Jr. é daqueles protagonistas de uma história de sucesso. Filho de uma tradicional família de pecuaristas de Paracatu, recém-formado em Administração de Empresas, chega até o pai e faz uma proposta não esperada: utilizar as terras para a agricultura. O pai logo viu com estranheza o pedido do filho, já que a região castigava as lavouras por conta do clima quente e a falta de chuvas.

Apesar de não ter experiência com agricultura, remodelou a fazenda e mesmo não tendo o apoio total do pai, seguiu adiante. “Com a necessidade, meu pai vendeu parte da fazenda. Vi que tinha que tecnificar o que tinha sobrado”. Junto à irmã, decidiu em 2004, não só plantar, mas irrigar. Via que essa era a alternativa certa para a adequação, além de ser um nicho de mercado.

Na primeira aposta, adquiriu dois pivôs que irrigavam 130 hectares. Com o lucro da safra, comprou mais dois equipamentos. E assim foi crescendo dentro do segmento: “O que sobrava investia”, lembra. Hoje são 40 pivôs e 2.500 hectares irrigados em uma área de 4 mil ha. “Não tem como mensurar o que aconteceu nos últimos 11 anos. A irrigação trouxe uma prosperidade muito grande”.

Com 35 funcionários direto, a produção é basicamente de soja, milho e feijão. A média é de 2,6 safras/ano, que só não é maior por um déficit na região: a falta de fluxo de colheita, onde não há onde guardar e sacar. Aproveitando da oportunidade, utiliza campo de semente para o inverno. A garantia que as sementeiras dão, possibilitam um giro maior e certo. “Usei na fazenda, que nada mais é que uma empresa a céu aberto, o que aprendi na faculdade”.


Fava Sementes

A Fava Sementes tem apenas três anos de mercado. Mas a experiência com agricultura do proprietário Luiz Fava Jr é muito maior, sendo 28 anos de irrigação. Com propriedades em Minas Gerais onde a produção é feita com milho sementes, Goiás e Bahia cultivam soja, feijão, milho, algodão e café.

Ao todo, nos três estados, são 12 mil hectares de área, onde 2.853 são irrigados por 15 equipamentos. Sete outros estão em andamento. Um dos pilares da propriedade é o café irrigado na Bahia: projeto de irrigação grande com maiores recursos disponíveis. A produção nas propriedades gira os 12 meses do ano, onde é possível fazer 2,5 safras/ano.

Cliente Irriger, Luiz Fava Neto, nova geração da Fava Sementes, diz que o sistema é o equilíbrio da irrigação.  “A agricultura com irrigação é mais eficiente e não está refém das condições climáticas”. A ideia é irrigar mais 5 mil hectares em Minas e Goiás e mais 3 mil na Bahia

Por conta da baixa lâmina d’água na região de Minas Gerais onde estão instalados, a irrigação é a salvação e os pivôs são ligados nos veranicos. Mesmo assim, a fazenda gira o ano todo, empregando 130 funcionários, e diminuindo o custo operacional de pessoas. “A fazenda encaixou como uma luva na irrigação. Não tem funcionário ocioso. Antes havia uma rotatividade muito grande. Hoje podemos formar equipe o que agrega qualidade no manejo da fazenda”. 


*Matéria de capa publicada em Pivot Point Brasil - agosto de 2015

Marco Túlio Paolinelli: O Produtor de Águas

Foto: Arquivo Agronelli
Engenheiro agrônomo, produtor rural e empresário, Marco Túlio Paolinelli é exemplo de produtividade e sustentabilidade. Há 26 anos à frente da Agronelli – empresa produtora de insumos agrícolas e agroindústria através da produção de madeira de reflorestamento, pecuária e de alimento, além de gestão de tecnologia, ele tem desenvolvido projetos sócio ambientais que não só respeitam o meio ambiente, como auxiliam na sua preservação e na construção da cidadania.

Os projetos “Produtor de Águas” e Águas Perenes” baseiam-se na recuperação de nascentes. Há 33 anos e ainda funcionário, começou a fazer acompanhamento da situação de uma mina na região de Uberaba, Minas Gerais, através de fotografias. Com a documentação, foi gerando conhecimento e através de analise detectou a queda da vasão da água. Há nove anos, com auxílio de estudo científico orientado pela Unesp, percebeu a necessidade de construir curvas de rio, bolsões de água da chuva e fazendo o plantio de árvores em 4,5 hectares, fortalecendo assim a nascente. O resultado: onde havia deserto, com a construções e adaptações, passará a ser em cinco ou seis anos uma mina perene.

O controle é feito semanalmente. A ideia principal é gerar água durante o período de seca, permitindo recurso para a sustentação dos serviços de abastecimentos de águas das cidades e para a irrigação das culturas de inverno. O sucesso do projeto está ultrapassando as fronteiras e outras minas já estão em observação. Com a adoção da ideia, em outra propriedade de 275 ha, Paolinelli tem a intenção de construir de 800 a 1000 bolsões que infiltrarão no lençol freático e plantando mais 40 mil árvores. Para tanto, já tem a parceria de empresas que participarão através de cotas de R$100,00/ano, e onde 100% do valor será revestido para ações sócio ambientais.

  Hoje com quatro unidades distribuídas em Cubatão, Cajati, Timóteo e a matriz em Uberaba, a Agronelli gera 250 empregos e distribui gesso para o Brasil todo. Há 15 anos, o Instituto Agronelli, busca levar orientação sócio ambiental para a comunidade como um todo. Escolas públicas e o hospital do câncer da cidade são os que mais são ajudados com os projetos do Instituto que alivia a degradação do meio ambiente, e gera a cidadania aos alunos do município.

De onde surge o Projeto Agronelli?
Depois de 11 anos trabalhando na antiga Fosfértil sendo responsável da área técnica e agronômica, já sabia como o gesso funcionava e como a ureia podia ser utilizada na aplicação de nitrogênio. A empresa tinha que doar o gesso que sobrava por ficar mais em conta do que depositar. Vendo aquilo, fiz uma proposta de direcionar o gesso para a Embrapa pesquisar e divulgar, vender parte para a Agronelli e parte para a Fosfértil. Eles toparam. Era muito mais interessante para o produtor do Mato Grosso, por exemplo, ter conhecimento de como aquele gesso era importante para a terra dele, do que doar sem ele conhecer. Sem o conhecimento, ele não pagaria nem o frete para buscar. No começo eu era sozinho. Depois com o tempo fui montando equipe e chegamos a vender 3 milhões de toneladas de produto no ano. Isso correspondia a uma carreta a cada cinco minutos saindo 24 horas por dia em um ano. Era muito gesso! Se você me perguntar se eu ganhei muito dinheiro, eu vou te dizer que não, porquê gesso é barato. Tem que ganhar no volume. O gratificante é saber que contribuímos para o agronegócio brasileiro, aumentando produtividade de açúcar, leite, soja, milho, etc: o quanto em milhões um produto que não valia nada, contribuiu para a produção e para o meio ambiente.

Em 25 anos de trabalho, como foi para o senhor, ver a necessidade de contribuir para que o agronegócio brasileiro se tornasse mais produtivo e sustentável?
 Sempre fui voltado para as ações sociais e ambientais. Como vim de família de agricultores, sabemos o quanto o meio rural precisa ver a necessidade das coisas: de praticar o que meu primo e ex-ministro da agricultura Alysson Paolinelli diz, fazer a revolução verde. O que eu quero é contribuir com o país. Primeiro peguei um “lixo” e transformei num produto que contribui com o agronegócio brasileiro. Depois aumentar a vasão de água de uma mina e para isso o que eu fiz? Plantei árvores! Mais nada. E isso, junto com os bolsões, melhoraram o fluxo de água do Rio Uberaba e consequentemente o abastecimento. A maioria das empresas contribuem com de 3 a 5% do lucro, limitando salários. Nós repassamos 20% do lucro dividido para contribuição. 

Uma das maiores dificuldades do agronegócio é gerar menos conflitos e mais soluções para o setor.  Qual a ferramenta você acredita ser essencial usar para desenvolver as questões do agronegócio brasileiro?
 Conscientização. Todo mundo fala que a cana de açúcar acaba com a terra. Onde pode haver uma ignorância tão grande como essa? Isso não existe! Hoje não tem queima mais, e quando tem é porque o produtor não conseguiu recursos para se estruturar. Nenhum fazendeiro quer queimar cana. Ele quer colher e deixar a matéria orgânica para o solo gerar fotossíntese, diminuir erosão e consequentemente substituir a gasolina. Mas, as pessoas não sabem e não tem noção. O produtor não quer destruir as terras dele. Os que fazem são minoria, e em tudo existe minoria. A maioria quer preservar a fazenda, fazer plantio direto. Olha o crescimento do plantio direto no Brasil. Hoje a Embrapa faz um trabalho respeitado e reconhecido internacionalmente produzindo e exportando tecnologia para o mundo, e ninguém sabe que somos líderes de produção de tecnologia tropical. Se pegarmos os últimos 20 anos, podemos ver consideravelmente, como aumentou a produtividade do Brasil.

Muito se fala da necessidade de otimização dentro das propriedades rurais brasileiras. Qual é a importância da irrigação no processo de mecanização do produtor rural?
 Vejo que não precisamos mais fazer desmatamento para aumentar a produtividade. E temos que aumentar a produtividade. Como? Investindo em tecnologias, variedades mais produtivas, formas de manejo e de conservação do solo, e, irrigação. A irrigação vai auxiliar e muito no processo de aceleração da produtividade, e ainda abastecendo o lençol freático. A água não vai embora. Vai e volta. Uma fazenda que durante janeiro, fevereiro e março guarda a água das chuvas em uma represa e que quando chegar a seca vai irrigar o alimento com essa água fez que mal? Nenhum! Só fez o bem, porque está inclusive melhorando o lençol freático que está alimentando as minas. É só benefício!

O senhor acredita que exista algum caminho estratégico que permita ao produtor em crescimento, seguir investindo de maneira efetiva e adequar-se?
Acredito na orientação. Mas é complicado, porque o pequeno produtor não tem essa orientação fácil. Teria se o trabalho maravilhoso que as Ematers, a Embrapa e a Epamig no caso de Minas já fizeram. Essa assistência técnica é muito importante é só tem acabado. É triste ver a Embrapa sobrevivendo com o dinheiro da iniciativa privada, num país que só tem arroz e feijão de qualidade por conta do trabalho lá atrás das pesquisas que a Embrapa fez. O que seria do país se não fosse a Embrapa? A gente estaria morrendo de fome. Para o grande é muito mais fácil. O sul de Goiás, o Mato Grosso, o oeste da Bahia, e sul do Maranhão e do Piauí estão numa realidade que mostra outro conceito de agricultura. É muito diferente. Lá esses produtores já têm a orientação e estão cada vez mais adiante. Nós, empresariados e instituições, temos que participar de feiras agrícolas e apresentar campos de demonstrações, fazendo um papel que não seria nosso se houvesse orientação ao homem do campo. Tem que ajudar de alguma forma.

Durante muitos anos a agricultura brasileira cresceu de forma horizontal, ou seja, mais área para fazer mais. Hoje o desafio é fazer mais com menos, ou seja, usando as técnicas de irrigação, armazenagem e agricultura de precisão para melhorar as produtividades dentro da porteira. Como você acredita que o agricultor pode encarar esse desafio: fazer mais com o mesmo?
Ele já está fazendo. Existe um mundo diferente onde muita gente produz muito. Se não fossem esses grandes agricultores, a gente não estaria onde está, com PIB sustentando a economia do país.

Apesar do setor do agronegócio crescer nos últimos anos, tendo sido fundamental no resultado do PIB e balança comercial, a população urbana tem dificuldade de entender o papel do produtor e das empresas ligadas ao agronegócio. Como mudar essa percepção da população urbana sobre a importância do agronegócio brasileiro?
Divulgar. Todo mundo fala, mas, nada acontece. A CNA, Confederação Nacional da Agricultura começou a fazer alguma coisa um tempo atrás, mas não continuou. Se depender dos outros nada vai acontecer. É a classe rural, através de ações e divulgando essas ações que vai mudar e mostrar o que a sociedade não enxerga.

O senhor acredita que o agronegócio brasileiro pode ser afetado pela baixa economia que afeta o país hoje?
Não acredito. O agronegócio vai sobreviver. Para ele é representativo. Se acontecer será muito pouco significativo.

Observando a atual condição econômica mundial e brasileira, quais são suas perspectivas em relação às safras de 2015 e 2016?
Acredito que vamos crescer em torno de 8%. Muita gente pode achar pouco, mas se compararmos com o crescimento dos Estados Unidos, subimos mais de sete pontos que os americanos, que têm uma base de 1, 2% ao ano. Mas, se juntarmos toda nossa produção de todos os grãos, equivale ao que os EUA produzem só de milho. Em termos de expansão, a eficiência de produção da nossa soja é maior que a americana. Temos condição de competir com eles em tecnologia. Com apenas 50 milhões de hectares de área depauperada, onde não há pastagem e só degradação, sem desmatar uma única árvore, podemos recuperar e muito o meio ambiente, auxiliando na produção de chuva e podendo ainda aumentar a nossa colheita em mais 100 milhões de toneladas, dos 208 que produzimos.

Quais os principais desafios da Agricultura Brasileira nos próximos 10 anos?
O maior problema nosso é a falta de infraestrutura. Temos péssimas formas de escoamento. Esse é 90% do problema. Levar a soja do Mato Grosso para Santos é muito mais caro que o custo da soja nos Estados Unidos. Para minimizar esse problema é investir agora em ferrovias, rodovias e portos. Um caminhão ficar semanas esperando na fila do porto de Santos para descarregar é um absurdo. Se não resolver isso agora, não tem nem como produzir mais, porque o problema vai ser muito mais sério daqui 10 anos.

*Entrevista publicada em Revista Pivot Point Brasil, agosto de 2015